25.6.06

bargain

ele fecha os olhos, procurando dentro de si. o silêncio do quarto só é quebrado pela respiração e o crepitar de uma vela.

ele diz as palavras que aprendeu de forma baixa, quase um sussurro. repetindo-as em sua mente, mais uma vez e outra e outra.

as paredes do quarto parecem se mover, afastando-se... o cômodo cresce e aos poucos muda de forma, frente a ele.

a vela apaga-se, com um barulho de bater de asas e o rapaz abre os olhos.

um corvo grande olha-o, com curiosidade. o pássaro dá dois passos à frente e abrindo o bico, para falar:

- isso sim é algo inesperado.

o rapaz levanta-se, assustado e admirado, olha em volta, para um cômodo muitas vezes maior que o quarto que deixou. o corvo faz um barulho com a garganta, chamando a atenção para si novamente.

- hã... eu posso te mostrar o lugar, depois. parece mesmo que você não deveria estar aqui.

- aqui é o reino onde os sonhos são tecidos?

o corvo vira a cabeça, divertidamente.

- hum... sim! você pode dizer desse jeito.

- e você é o senhor daqui?

- não, não! sou um dos empregados daqui. se quiser, te levo até o chefe.

nesse momento, as sombras adiante deles parecem se mover, abrindo passagem para um homem alto, vestido totalmente de negro. os olhos parecem poços refletindo a luz das estrelas, em meio a um rosto pálido como uma estátua. ele fala com uma voz que lembra os sons da noite.

- não será preciso, matthew... eu percebi a chegada de nosso... visitante.

o corvo voa em direção ao homem e pousa em seu ombro.

- oi, chefe! acho que temos um perdido, aqui.

- sim... ele veio para o sonhar através dos caminhos antigos... é admirável o que os mortais conseguem, quando se esforçam.

- eu... você é um deles, não? um dos perpétuos. lorde sonho.

- sim... eu sou sonho, dos perpétuos. e você veio até o meu reino em busca de algo...

- você é o senhor das histórias. e é isso que eu quero... eu quero conhecer as histórias. quero escrever sobre elas.

o senhor dos sonhos voltou-se para o corvo:

- matthew... deixe-nos a sós...

- ok, chefe!

o pássaro voou para as sombras, lançando o que poderia se chamar de um sorriso de corvo para o rapaz. o homem de negro aproxima-se mais e o rapaz percebe que em algum lugar, no manto dele, uma chama queima, antiga e inalcansável.

- me disseram que eu deveria procurá-lo. que você poderia me entregar o que posso.

- sim... eu posso entregar-lhe as histórias...

o jovem rapaz sorri.

- mas você deverá deixar algo seu aqui.

- o quê? eu não trouxe nada.

- se você desejar as histórias, deve entregar algo que seja seu. é a lei...

- mas...

- você aceita?

ele pensa, por vários segundos. o homem a sua frente fica impassível. seu rosto de estátua não se move.

- eu... eu aceito.

- pois bem. que seja...

e o sonho toca a testa do rapaz. ele fecha os olhos e vê todas as histórias rodando à sua volta, ele as recebe dentro de si. e acorda.

o seu quarto está de volta. a vela está apagada, após queimar até o fim.

ele se levanta, com um sorriso ainda hesitante no rosto. ele pega papel e caneta e começa a escrever. escreve até que seus olhos ardem e sua mão comece a doer. ele está cansado, exausto. deita-se na cama e fecha os olhos, triunfante.

mas ele não consegue dormir.

nunca mais conseguirá.

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