17.5.07

chão do banheiro

a menina está sentada no chão do banheiro.

ela olha para a faca de cozinha a sua frente.

sonha não estar ali. sonha em caminhar no meio de todos sem sentir que tudo o que existe é uma mentira. uma ilusão.

ela abraça as próprias pernas, procurando proteção dentro de si. mas ela encontra um vazio grande demais.

a menina chora.

e aos poucos as paredes vão desaparecendo. a pia pára de pingar e some. a porta trancada parece se tornar etérea. o mundo some, pouco a pouco a sua frente.

o vazio que havia dentro dela pouco a pouco ocupa todo o mundo. não há sons. não há sensações. só um nada claustrofóbico.

ela tateia o vazio. ela sente o frio do cabo de metal.

a faca raspa forte no braço. cortando, dilacerando a carne.

com força a menina faz sulcos fundos na pele clara.

a dor traz a realidade de volta.

e a menina balança a cabeça, sentada no chão frio enquanto fios de um vermelho vivo colorem o mundo.
o anjo chora.

em um quarto de paredes sujas e rachadas, ele chora.

as lágrimas escorrem de seus olhos fechados. pequenos diamantes brilham no chão aos seus pés, onde elas caem.

ele sente o coração de toda a humanidade.

e por isso ele chora.

realidade dissonante

inquietação.

por que eu sempre vivi com essa inquietação? por que não consigo calar os pensamentos, para dormir em paz uma só noite.

por que eu preciso me deitar apenas quando o corpo não aguenta mais? por que eu quero absorver cada pedaço, cada fagulha de mundo que há? por que ao fazer isso eu sinto dor?

é como estar em uma sala saturada de luz. abrir os olhos dói demais.

quero pousar a cabeça. quero pousar o coração.

quero sentir uma mão fazendo carinho em meus cabelos e só fechar os olhos e aproveitar.

preciso.

preciso me sentir em foco com o mundo.

16.5.07

mentiras

- o senhor tem um trocado pra me dar? eu tô precisando comprar comida pros meus filhos.

- não, amigo. desculpa, mas eu tô duro.

e o homem continua a caminhar, esquecendo quase totalmente da mulher que acabou de abordá-lo com um olhar perdido. e esquecendo dos 10 reais enterrados no bolso da calça social.


eu odeio mentiras. odeio as pequenas mentiras que contamos: "putz! eu esqueci. amanhã eu trago."
odeio as grandes mentiras: "claro que eu te amo. por que eu mentiria?"

odeio saber que muito do que eu sei é mentira. "mentir é inerente ao ser humano. é necessário para a vida em sociedade", ele diz. que patética é nossa sociedade, então. elevada sobre um pilar de falsidade.

odeio saber que existe mentira em tudo. odeio saber que mesmo sabendo disso, quando descubro uma mentira me sinto traído.

odeio saber que isso é inevitável.

odeio mais ainda saber que eu minto como todos os outros.

15.5.07

inquietação.

porque ela só surge quando estou sozinho?

sinto falta de observar a lua.
eu vejo luz em você.
quando você vê confusão, eu vejo possibilidades.
quando você se perde, eu quero estender a mão.
quando você chora, quero te abraçar.
quando você sorri, eu me sinto um pouco mais feliz.

gosto de ser o seu anjo. gosto de caminhar ao seu lado, olhando pra você do alto. gosto de passar minhas mãos por seu corpo, só pra ter certeza que você está lá.

sou seu amigo.

seu protetor.

seu amante.

você será sempre uma fada de cabelos coloridos e nariz arrebitado.

amo você.
ela tenta gritar. a mão em sua garganta aperta, forte. ela bate nele mas ele a segura.
ela escuta o próprio coração bater alto rápido demais.
o medo escorre por seu corpo, tomando tudo.
respirar. ela precisa respirar.
a mão continua apertando. os olhos dela estão arregalados. ela vê o rosto dele. não há emoção.
ajuda.
alguém ajude.
os olhos dele são negros. o cabelo também. a mão aperta forte.
algo quente escorre pelas pernas dela.
a mão no pescoço vai ficando fria. tudo vai ficando frio.
ela grita, sem som algum. dentro de sua garganta, algo estala e se quebra.
ela olha para ele.
ela vê um brilho na outra mão.
e sente seu corpo se abrir.
frio.
tão frio.
vermelho.
os olhos.
negros.

13.5.07

eu odeio bloqueios de escritor!

shit.
eu não estou acostumado com isso.

ao mesmo tempo em que minha cabeça clama por solidão, por silêncio e lugares vazios, meu coração pede para estar com você.


eu não sei lidar com o amor direito.

parece que ele vai sobrepujar tudo em mim.

dá um pouco de medo, pensar que eu não controlo tudo em mim.

mas ainda assim, eu quero você. e quero estar com você.