7.5.06

film noir

a lâmpada pisca erraticamente, mal iluminando as paredes sujas da sala...

ele está sentado, olhando para a arma e o envelope, sobre a mesa. os olhos parecem desfocados, olhando para outro lugar, outra época.

um dos pés bate nervosamente no chão. ele não percebe o tique.

ele espera. lá fora, o elevador do prédio começa a trabalhar, fazendo um barulho monstruoso.

o homem aperta as mãos. ele está nervoso. em seu estômago, algo se revira.

o elevador pára no andar, logo à frente do apartamento. a porta corre... ele escuta passos. os olhos ganham um brilho. há sentimentos demais em seu olhar.

a porta se abre devagar. um jovem de cabelos loiros aparece. ele olha para o homem sentado na cadeira. seus olhos correm rapidamente para a arma sobre a mesa.

mas ele não parece surpreso.

o homem levanta-se. pega a arma sobre a mesa e aponta para o garoto.

o garoto tem os olhos vidrados. parece não ter certeza do que está acontecendo.

ele abre a boca, mas é o homem quem fala:

- eu sabia que você viria pra cá. tá com tanta droga no seu corpo que não consegue mais pensar. senta aí!

- cara... eu não tive culpa... ela...

- cala a boca! senta na porra da cadeira!

o garoto desaba sobre a cadeira velha. o homem olha pra ele. a arma pesa em sua mão. quer acabar com tudo. quer voltar no tempo. mas continua ali, naquela sala suja, com a arma na mão e a sensação no peito.

- ela confiou em você! queria tirar o irmãozinho do mundo das drogas. "queria dar uma chance a ele", ela dizia. e é assim que você paga!

- porra... eu não tive nada a ver com aquilo. ela foi lá porque quis... eu não... eu não... não queria que ela fosse me pegar. falei pra ela não ir...

- três! ela foi estuprada por três, seu merda! ela foi te buscar e é isso que sobrou dela!

o homem apanha o envelope e o joga na cara do rapaz, que chora.

- abre! olha as fotos!

coloca a arma na cabeça do garoto com força.

o garoto abre o envelope e olha as fotos, chorando como criança.

o homem acha a cena patética. sabe que o garoto não sente praticamente nada, por causa do barato. mas ele precisa ver.

- olha pra ela, desgraçado! olha pro que você fez com ela!

- cara! eu não tava lá... não vi os caras fazendo isso.

- o socorro demorou meia hora, até achar o beco onde ela estava. jogada no lixo! ela foi pro hospital... demorou 3 horas, até que morresse...

o homem começa a chorar, também. o estômago está embrulhado, com a lembrança do que aconteceu. ele quer vomitar. quer trazer ela de volta.

- por favor! eu não fiz nada! eu não fiz nada... ela não tinha que ir lá!

- ela chamou o seu nome, na minha frente, na cama do hospital. mal podia ver e ainda assim, chamou o seu nome, verme! ela morreu por sua causa... ela morreu... ela...

- eu não queria... ela não... eu não queria... eu não queria...

o tiro atravessa o crânio. a cadeira e o garoto caem em um estranho movimento entrecortado, por causa da iluminação da sala.

o cheiro de pólvora sobe. o homem está chorando.

chora pelo que perdeu, mais do que pelo que acabou de fazer. chora por uma menina que morreu em seus braços. chora por saber que o que acabou de fazer não trará ela de volta.

o jovem faz movimentos estranhos, no chão... o sangue se espalha rapidamente em um vermelho escuro. a respiração termina abruptamente.

as fotos estão espalhadas pelo chão. uma delas pousa à frente dos olhos do garoto. uma menina loira em uma mesa de autópsia olha para o irmão morto.

a luz se apaga, uma última vez.

passos no corredor e o barulho da porta do elevador.

está terminado.

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