a lâmpada pisca erraticamente, mal iluminando as paredes sujas da sala...
ele está sentado, olhando para a arma e o envelope, sobre a mesa. os olhos parecem desfocados, olhando para outro lugar, outra época.
um dos pés bate nervosamente no chão. ele não percebe o tique.
ele espera. lá fora, o elevador do prédio começa a trabalhar, fazendo um barulho monstruoso.
o homem aperta as mãos. ele está nervoso. em seu estômago, algo se revira.
o elevador pára no andar, logo à frente do apartamento. a porta corre... ele escuta passos. os olhos ganham um brilho. há sentimentos demais em seu olhar.
a porta se abre devagar. um jovem de cabelos loiros aparece. ele olha para o homem sentado na cadeira. seus olhos correm rapidamente para a arma sobre a mesa.
mas ele não parece surpreso.
o homem levanta-se. pega a arma sobre a mesa e aponta para o garoto.
o garoto tem os olhos vidrados. parece não ter certeza do que está acontecendo.
ele abre a boca, mas é o homem quem fala:
- eu sabia que você viria pra cá. tá com tanta droga no seu corpo que não consegue mais pensar. senta aí!
- cara... eu não tive culpa... ela...
- cala a boca! senta na porra da cadeira!
o garoto desaba sobre a cadeira velha. o homem olha pra ele. a arma pesa em sua mão. quer acabar com tudo. quer voltar no tempo. mas continua ali, naquela sala suja, com a arma na mão e a sensação no peito.
- ela confiou em você! queria tirar o irmãozinho do mundo das drogas. "queria dar uma chance a ele", ela dizia. e é assim que você paga!
- porra... eu não tive nada a ver com aquilo. ela foi lá porque quis... eu não... eu não... não queria que ela fosse me pegar. falei pra ela não ir...
- três! ela foi estuprada por três, seu merda! ela foi te buscar e é isso que sobrou dela!
o homem apanha o envelope e o joga na cara do rapaz, que chora.
- abre! olha as fotos!
coloca a arma na cabeça do garoto com força.
o garoto abre o envelope e olha as fotos, chorando como criança.
o homem acha a cena patética. sabe que o garoto não sente praticamente nada, por causa do barato. mas ele precisa ver.
- olha pra ela, desgraçado! olha pro que você fez com ela!
- cara! eu não tava lá... não vi os caras fazendo isso.
- o socorro demorou meia hora, até achar o beco onde ela estava. jogada no lixo! ela foi pro hospital... demorou 3 horas, até que morresse...
o homem começa a chorar, também. o estômago está embrulhado, com a lembrança do que aconteceu. ele quer vomitar. quer trazer ela de volta.
- por favor! eu não fiz nada! eu não fiz nada... ela não tinha que ir lá!
- ela chamou o seu nome, na minha frente, na cama do hospital. mal podia ver e ainda assim, chamou o seu nome, verme! ela morreu por sua causa... ela morreu... ela...
- eu não queria... ela não... eu não queria... eu não queria...
o tiro atravessa o crânio. a cadeira e o garoto caem em um estranho movimento entrecortado, por causa da iluminação da sala.
o cheiro de pólvora sobe. o homem está chorando.
chora pelo que perdeu, mais do que pelo que acabou de fazer. chora por uma menina que morreu em seus braços. chora por saber que o que acabou de fazer não trará ela de volta.
o jovem faz movimentos estranhos, no chão... o sangue se espalha rapidamente em um vermelho escuro. a respiração termina abruptamente.
as fotos estão espalhadas pelo chão. uma delas pousa à frente dos olhos do garoto. uma menina loira em uma mesa de autópsia olha para o irmão morto.
a luz se apaga, uma última vez.
passos no corredor e o barulho da porta do elevador.
está terminado.
7.5.06
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