ela observa a cidade do topo do prédio mais alto. uma neblina baixa começa a se dissipar, conforme os primeiros raios de um sol tímido de inverno invade as ruas.
o ar é espesso e frio. o som dos carros mais abaixo começa a aumentar conforme eles tomam cada espaço livre no asfalto.
ela sorri, sentada no beiral. o cabelo e as roupas são de um negro intenso e balançam suavemente com o vento. a pele branca se ilumina com o nascer do sol, parecendo ela própria emanar a luz do dia.
a menina se levanta e abre os braços. olhos de um azul profundo se fecham devagar.
em cada centímetro de seu corpo ela sente a cidade.
no metrô um homem lê um livro, intrigado com a atitude do protagonista e ela está ao seu lado.
um casal acorda mais ao sul e ele a beija, duvidando por alguns instantes do amor que jurou meses atrás.
uma velha joga migalhas de pão para os pombos do parque, enquanto uma menina de olhos azuis e cabelo negro é a única a perceber.
um garoto rico escreve uma carta para papai noel e ela sente em si a empolgação e a magia.
uma adolescente acorda e vê a mancha de seu próprio sangue na cama. com dor e sentindo medo, ela se encolhe, pedindo perdão pela escolha que fez e não sente o carinho delicado feito por uma mão de pele branca.
em cada suspiro, em cada desejo. todos os olhares e todas as palavras são dela.
ela sente fome, dor, sorri, pede perdão, dorme, mata, se maravilha e entristesse.
de braços abertos ela se joga do prédio.
nas ruas, um garoto diz para a avó que sentiu um arrepio.
ela diz que um anjo passou por ele.
19.12.07
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