20.9.06

acordou com o corpo dolorido.

o sol já estava alto no céu. dormira na praça. não. desmaiara na praça. a dor do seu corpo o faz lembrar que havia apanhado de novo dos caras mais velhos e eles haviam roubado o dinheiro que ele havia conseguido.

havia um gosto de sangue velho em sua boca. o olho parecia estar inchado, mas ele não se importava muito. a fome doía mais dentro dele do que qualquer outra dor física. a fome corroía seu corpo. não o deixava pensar, não o deixava.

ele levanta, caminha até a rua, olhando as pessoas. precisava comer algo. qualquer coisa.

mas ele era invisível. os homens e mulheres passavam a sua volta, ignorando os olhos que pediam atenção. aprendera desde cedo que as crianças de rua eram invisíveis. eventualmente, um dono de loja ou um policial o via, quando tentava roubar algo. mas era invisível quase o tempo todo. por alguma razão que ele não sabia nomear, sentia um vazio dentro de si, quando pensava que não podia ser visto.

vira uma vez outro menino, mais novo que ele, morto em uma calçada do centro. as pessoas passavam por ele como se passassem por um animal.

era isso que ele sentia. sentia que para eles era como um animal. menos que isso, ainda.

pediu, implorou por esmola, mas não ganhou nada. depois de 2 horas, sentou-se junto à marquize de um velho edifício e, com a cabeça entre as mãos, deixou duas lágrimas escaparem por seus olhos. chorou de raiva. chorou de frustração.

e acima de tudo, chorou de fome.

não percebeu que uma menina sentou ao seu lado. ela usava uma camiseta branca, muito maior que o tamanho dela e que agora era de uma cor indefinida. a cor das ruas.

ela deu a ele uma garrafa plástica. no fundo, uma cola espessa. ele cheirou, sem falar nada. conhecia ela.

eles dormiam juntos, às vezes, nas ruas. cuidavam um do outro, quando podiam.

o garoto fechou os olhos, embalado pela onda da cola.

sonhou com a menina. estavam juntos, em um lugar limpo.

os dois riam. e eram felizes.

mas ele abriu os olhos.

os dois se abraçaram, invisíveis para o resto do mundo.

de um jeito torto, da única maneira que os dois conheciam, eles experimentaram algo que as outras pessoas chamavam de amor.

Um comentário:

Anônimo disse...

Qualquer tipo de amor vale a pena, vale a pena amar qualquer pessoa... Vale a pena apenas amar!
Abreijos! @}~