29.11.04

tale of the dreaming

"esse é o seu sonho?"
"como?"

a menina olhava para o homem com um olhar de quem acabou de descobrir um grande segredo.

"esse lugar... é o seu sonho, né?"
"eu... eu não sei. como vim parar aqui"?
"ora, como todos os outros. ou vc é parte de um sonho, ou é um sonhador!"
"ah! acho que nunca fui um sonho."
"viu? eu sabia!!! estamos no seu sonho."
"hummm... e o que eu... huh... nós faremos agora?"
"não sei, o sonho é seu, ué!"

o homem olha a sua volta, tentando organizar seus pensamentos, mas a última coisa que se lembra é de ir para a cama. às 11h, como fizera todas as noites, nos últimos 27 anos. tudo aquilo era muito insólito, mas de alguma maneira, ele não sentia medo. só uma pequena confusão.
de qualquer maneira, a menina parecia estar perdendo a paciência.

"seus sonhos são sempre assim tão chatos?"
"o quê?"
"nada tá acontecendo. por que vc não sonha com princesas e dragões mágicos e cavaleiros de armadura?"
"cavaleiros? acho que realmente nunca sonhei com isso, menininha."
"humpf... que saco!"
"ei! calma."
"eu conheço um dragão! ele pode se juntar a nós, pode?"
"um dragão???"
"ééééééééé! dragão!!!! ei, dragão!!!! dragããããããããããããããããão!!!!"

o homem olha incrédulo para a menina por alguns instantes, até perceber uma sombra se formando atrás dele.

"o que vc quer?"

uma voz faz tremer o ar. o rapaz fecha os olhos, dizendo a si mesmo que aquilo devia ser uma brincadeira.

"oi, dragão! eu queria saber se vc pode ser parte do sonho desse moço aí, ó."
"hummmm... está bem... mas ele é meio franzino para um cavaleiro. e a princesa, onde está?"

o homem vira-se para trás. e a alguns passos, um enorme dragão vermelho está sentado sobre a cauda, com uma das patas sobre o joelho, apoiando o rosto.

"por deus!!!!!!"

o dragão olha assustado a sua volta:

"o que foi?"
"vc! vc é um dragão!!!"
"ah... vc é perspicaz. o que fez vc tirar essa conclusão, hein? imagino se foram as escamas vermelhas que recobrem meu corpo, ou talvez as asas... certamente não foi a minha singela cauda."
"que lugar é esse??? o que está acontecendo aqui????"

a menininha vai até os pés do dragão e olha para o homem com uma cara de quem está entediada.

"nossa, como vc é gritão."

o dragão sorri para ela. ele a pega com uma das mãos e a trás perto do seu focinho de dragão.

"ele é o dono desse sonho? acho que encontramos um daqueles meio sem imaginação."
"acho que ele está sentindo a falta da princesa. precisamos de uma princesa para ele"
"ah! eu conheço uma..."

o dragão solta um rosnado enorme, e fogo salta de sua boca, em direção aos céus. o rapaz cai ao chão, tremendo.

"olá, dragão! desculpe a demora. a droga do vestido não queria entrar de jeito nenhum. onde está meu cavaleiro?"

a princesa olhava em volta, tendo a certeza de que seus cabelos iriam brilhar à luz do sol a cada movimento. ao olhar em direção ao rapaz, ela fica um pouco decepcionada.

"é ele? ele não é meio... magrinho para ser um cavaleiro?"

a menina olha para ela com cara de brava.

"não fala assim dele!!! ele é legal. só é meio parado."
"ah... tá bem... sonho é sonho, né? só não podemos demorar, tenho que refazer minhas unhas logo"
"oba!!!! tio, eu vou ali para aquela pedra, tá? pra ver vc lutar contra o dragão para salvar a princesa!"

o homem olha desesperado para a menina.

"lutar contra o... ei! eu não quero lut..."

a princesa corre para os braços dele, que nesse momento percebe que está vestindo um armadura prateada e traz uma espada em suas mãos. a armadura incomoda bastante na parte de baixo e ele mal consegue segurar a espada. a princesa grita perto dos seus ouvidos.

"salve-me, senhor!!! esse monstro horrível destruiu minha casa, matou minha família e agora me quer! se me salvar, prometo entregar-lhe a minha mão!"

o dragão levanta-se e apoia-se nas quatro patas, rugindo ameaçadoramente e soltando labaredas enquanto aproxima-se dos dois. o rapaz fica com medo e joga a espada de qualquer maneira, em direção ao dragão. a arma cai com a ponta em cima da cauda da criatura que faz uma cara de dor.

"ei!!! não é para ser assim!!!!! vc sabia que essa espada é afiada, seu maluco???"

o rapaz não aguenta mais e grita, desesperado, enquanto afasta a princesa de si.

"chega!!! chega disso tudo! eu quero sair dessa droga de lugar agora! menininha, vc é louca! todos vcs são loucos! eu quero ir agora!!!"

- pop -

uma pequena nuvem de fumaça é tudo o que sobrou, no local onde o homem estava. os três: a menina, o dragão e a princesa se entreolham, por alguns instantes. a menina faz uma cara de desolação.

"ah... droga... de novo ele foi embora antes do sonho acabar... como ele é chato!"

"não se preocupe, pequenina, ele voltará amanhã."

"lorde sonho!"

o dragão se abaixa, numa reverência e a princesa sorri, olhando sedutoramente para o senhor do sonhar.

"princesa... creio que vc tem que participar de alguns sonhos mais adultos, ainda essa noite, não?"
"sim, milorde. com licença."

o lorde moldador olha para a pequena criança com um olhar reprovador, da cor da noite.

"dragão, dragão... vc não deveria estar guardando a entrada do meu castelo?"
"sim, milorde... voltarei nesse momento. com a sua permissão..."
"e vc, pequenina? o que fará agora?"
"hummmmm... não sei. será que o tio fiddler's green deixa eu colher flores nele???"
"provavelmente. mas seja gentil com ele, está bem?"
"tá bem, lorde sonho! beijo para o senhor."
"mande minhas saudações a ele."
"tá!"

e o homem vestido de negro olha a menina correr e começar a desaparecer na distância e ele sorri um sorriso fulgaz... quase a sombra de um sorriso.

"ele voltará amanhã... todos eles voltam na noite seguinte..."

2 comentários:

Vanessa disse...

Pra ondede eu mando meu currículo?
Quero um emprego como o da menininha!!!
Agora!
hahahahahahahahha!

Anônimo disse...

Uma menina triste... Um rapaz sonhador...
História da vida de muita gente! Ás vezes a menina não satisfeita em ser só em sua melancolia, insiste, mesmo que sem querer, em adubar as tristezas dos que a cercam... No interior do seu ser, ela aprecia ser sombria e deseja ocultar o sol de todos que caminham ao seu lado... Mesmo dizendo palavras doces como o mel - melancolia... Mesmo acariciando os sentimentos e desejando bons ventos... Mesmo assim, a dor que lhe acidifica a alma a apraz e a faz sentir maior e ao mesmo tempo pequena em seus bosques oníricos.
Por que será que quem a menina mais estima, insiste em viver distante dela? E assim para sempre será... Por que esta monumental insatisfação sobrevivente no fundo da alma a soluçar? Uma máscara, um estilo de vida... Uma inquietante predisposição a loucura e ao nada, à morte e ao prazer...
Quem é o rapaz que sonha? Quem é a menina triste?
De onde vem tanta amargura?